Por ser uma das principais representantes, a nível mundial, do indie rock argentino atualmente, a banda Las Ligas Menores gerou muita expectativa em torno de sua estreia no Brasil. Recentemente, em entrevista ao Musicult, a banda falou sobre essa expectativa. E o primeiro encontro finalmente aconteceu: Las Ligas Menores subiu ao palco do Cineclube Cortina, em São Paulo, na noite do dia 3 de agosto, uma quinta-feira, e se conectou de forma extraordinária com o público brasileiro, que mostrou seu profundo amor pela banda platense.
A abertura do evento ficou a cargo do grupo paulista de rock psicodélico Bike, que exibiu as cores e texturas de suas viagens sonoras, com projeções que contribuíram para a criação de uma atmosfera alucinógena e envolvente.
Começo incerto e o passeio da Bike
Pouco antes de o show da Bike começar, o Cineclube Cortina ainda se via consideravelmente vazio, com grupos esparsos de pessoas. Assim, a possibilidade de casa cheia até mesmo para o show principal da noite se tornava uma dúvida.
Mas, no instante em que os efeitos espaciais e timbres estridentes da Bike tomaram o lugar, pouco após as 21h30, o público se aproximou do palco e se multiplicou com incrível rapidez. A apresentação psicodélica de Julito Cavalcante, Diego Xavier, Daniel Fumega e João Gouvea teve início um tanto introspectivo. Banda e público pareciam estar se estudando e se conhecendo melhor.
O show foi, então, crescendo em intensidade e resposta da plateia. As palmas foram sendo mais frequentes e os músicos ficavam cada vez mais à vontade para construir a lisergia de suas cadências progressivas, se entregando com habilidade e sentimento a faixas como Santa Cabeça e Filha do Vento, de seu álbum mais recente, Arte Bruta (2023).
Dessa forma, a Bike conduziu o passeio proposto ao público, deixando sua alma e sua música crescerem. A banda saiu de cena muito aplaudida, agradecendo a uma plateia já cheia, envolvida e muito bem aquecida para encontrar Las Ligas Menores.
Las Ligas Menores em São Paulo e o imenso poder de sua leveza
Não muito tempo depois, Anabella Cartolano (voz e guitarra), Pablo Kemper (voz e guitarra), Nina Carrara (teclados e vozes de apoio) e Angie Cases Bocci (baixo) chegaram timidamente ao palco, colocando setlists no chão e afinando seus instrumentos, sem a baterista oficial Micaela García, que não veio ao Brasil.
A preparação por si só fez com que o público se aproximasse ainda mais. Já se ouviam alguns gritos de empolgação e expectativa. Em seguida, Las Ligas Menores começou seu show em São Paulo com a faixa Contando Lunas, do álbum Fuego Artificial (2018). Mostravam uma postura sedutora e cativante, ainda que tímida e, contraditoriamente, despreocupada.
O carinho e atenção da banda com os fãs ficou claro pelos agradecimentos feitos ao final de cada canção. E, gradualmente, as interações entre plateia e Las Ligas se tornavam mais abertas, mais apaixonadas, durante as músicas seguintes, Mejor Así e El Baile de Elvis.
Já enquanto tocavam Hoy Me Espera, o som do ambiente deixou a desejar, causando persistentes microfonias. Mas a banda não se desconcentrou — muito pelo contrário, Las Ligas exibia, ali, uma nova dimensão de intensidade e energia em suas canções, que, nas gravações de estúdio, transmitem sensações mais suaves e contidas. Com presença de palco e peso sonoro, a banda apresentava suas faixas com uma força que trazia o público mais e mais para perto de si, fazendo todos vibrarem e se deixarem levar por seus acordes naturais, riffs marcantes e pela voz sempre tranquila e imponente de Anabella.
Nesse ritmo, o show seguiu, com uma conexão entre plateia e banda que crescia em visceralidade e proximidade, atravessando canções como Accidente, En Invierno, Piedra del Águila e Todo Lo Que Pienso Hoy — esta última, um emocionante e muito bem executado cover da banda Pixies.
De todo modo, o aumento da energia no ambiente ainda fazia contraste com a pose introspectiva dos músicos, que vez ou outra riam de alguma frase solta do público, como “Messi es mejor que Neymar”, mantinham seus agradecimentos entre músicas e pouco interagiam entre si mesmos no palco. Assim, Las Ligas — em especial sua vocalista — pareciam dizer timidamente: estamos aqui, podem vir…
E o público brasileiro entendeu o recado, se entregando de vez à banda durante as últimas músicas do set, abrindo rodas de bate-cabeça e cantando todas as letras com força. Assim foi recebido o cover de Mabuse, da banda Los Punsetes, e os hits da Las Ligas A 1200 Km e Hice Todo Mal. O público pulava, cantava e dançava, eufórico, mostrando todo o amor que tem pela banda argentina.
Em meio a tanta paixão, foram tocadas as últimas faixas: Renault Fuego, Crecer e Ni una Canción. Las Ligas Menores deixou o palco e, depois de muitos pedidos para que tocasse mais uma, voltou, encerrando a noite inesquecível com De la Mano.
Em sua apresentação, o grupo mostrou por que é um dos expoentes sul-americanos de seu gênero, desfilando um indie rock magnético — de diálogos equilibrados de guitarras, baixo e sintetizador — com precisão, entrosamento e atitude.
A banda, ao mesmo tempo entregue ao público e voltada à sua introspecção, construiu uma atmosfera profundamente sedutora que, sem dúvida, marcou a vida de cada um dos presentes e criou ainda mais expectativa para um segundo encontro.