Depois de 27 anos, a banda norte-americana The Black Crowes estava de volta ao Brasil, “apenas” com os irmãos Rich e Chris Robinson, da formação original – entre aspas, porque quem tem essa dupla já sai com o jogo ganho.
Nada como um bom show de rock and roll pra compensar uma semana de dilúvio infinito na capital paulista. Foi assim que a ansiedade bateu desde o começo do dia.
Existem vitórias e goleadas, e o Black Crowes veio preparado pra entregar muito mais do que só os três pontos. Banda entrosadíssima, com um teclado absolutamente hipnotizante, cozinha redonda e duas excelentes backing vocals, que mantinham ao vivo o nível que eles sempre entregaram em estúdio.
A expectativa é o combustível da nossa vida. Confesso que passei a semana com aquela sensação de que o show seria muito bom, mas que as décadas de estrada tratariam de impedir que eles brilhassem como no primeiro show em solo brasileiro, no longínquo 1996. Falhei miseravelmente na previsão – que bom.
Chris Robinson continua voando nos vocais. Arrisco dizer que foi a melhor apresentação ao vivo que já vi de um cantor. Impressionante a semelhança entre o que ele fez no palco com as gravações dos álbuns. Tudo isso com um improviso no ritmo das estrofes que praticamente impedia o público de conseguir acompanhá-lo.
Chris já não é mais aquele sujeito magricelo que dançava e encantava em cima dos tapetes que enfeitavam o palco do Hollywood Rock, mas o carisma e presença de palco seguem intactos. Seu irmão Rich continua mais tímido, mas seus riffs de guitarra não. Eles fazem questão de protagonizar cada canção da banda.
Impossível não lembrar que minha versão adolescente, lá no Pacaembu, foi pra ver Jimmy Page e Robert Plant (e também Raimundos – descanse em paz, Canisso) e acabou sendo surpreendida pelo incrível show dos Crowes naquele festival. Roubaram a cena, sem dó.
33 anos de Shake Your Money Maker
Mas voltando dessa viagem no tempo… a turnê comemora o lançamento do Shake Your Money Maker (1990), primeiro álbum da banda. E eles tocaram, na sequência exata, todas as dez músicas desse que é o disco mais “setentista” da década de 90. Uma viagem deliciosa, na qual o único defeito era ter hora pra acabar.
Tem música que é boa no som da nossa sala, e tem música que rende mais no palco. Essa turnê veio pra mostrar que esse disco é polivalente e arregaça de qualquer jeito. A cada canção, um novo delírio coletivo.
Após quase uma hora dos hits do álbum, a banda anuncia que a homenagem estava completa e já emenda “Sometimes Salvation”, música do The Southern Harmony and Musical Companion (1992) que talvez seja a mais linda balada da banda – difícil escolher só uma.
Mais quatro clássicos dos Black Crowes, que só não foram perfeitos por conta de um pequeno momento de caos sonoro durante “Thorn in My Pride”, e eles deixaram o palco após o megassucesso “Remedy”, com o público extasiado. Quem é de se arrepiar, arrepiou. Breve descanso e voltaram com mais uma pérola na manga, a ótima “Virtue and Vice”.
O público saiu do Espaço Unimed com aquele misto de “tô saciado, mas quero mais”. Não tinha mais, infelizmente. Aliás, não tem mais show deles no Brasil, por mais absurdo que pareça. Só uma data por aqui pra uma banda como o Black Crowes chega a ser criminoso.
Agora só resta torcer para os irmãos Robinson não demorarem mais algumas décadas com outro show desse calibre. Prometo que não vou subestimá-los pela terceira vez. Não sou tão teimoso. Fica essa lição para a vida.
Confira o setlist do Black Crowes no Espaço Unimed
- Twice as Hard
- Jealous Again
- Sister Luck
- Could I’ve Been So Blind
- Seeing Things
- Hard to Handle (cover de Otis Redding)
- Thick n’ Thin
- She Talks to Angels
- Struttin’ Blues
- Stare It Cold
- Sometimes Salvation
- Wiser Time
- Thorn in My Pride
- Sting Me
- Remedy
- Virtue and Vice
Obrigado por dividir esse momento, baita show e crônica perfeita.