O Bayside Kings é, sem dúvida, uma das bandas mais relevantes do cenário underground atualmente. Desde 2010 na estrada, a banda de Santos já era famosa por seus shows enérgicos, mas desde 2021, o Bayside, que tem uma forte presença não só de palco, mas também nas redes sociais, fez ainda mais barulho ao começar a cantar em português.
Depois de três álbuns em inglês, a banda, formada por Milton Aguiar, Emanuel Filgueira, Matheus Santacruz e David Gonzalez, anunciou o disco #LivreParaTodos, projeto conceitual que dividido em 4 partes, duas delas já lançadas e a terceira começando a dar as caras, com o single mais recente, (DES)OBEDECER, lançado no último dia 28.
Esse foi o primeiro single do Bayside Kings pela Repetente Records, selo de música independente, que recentemente completou 1 ano e, durante a festa de aniversário, celebrou também a parceria com a banda.
>>Veja aqui tudo o que rolou na festa de 1 ano da Repetente Records
Com tantas mudanças e lançamentos previstos e tudo isso enquanto a banda segue na estrada, a gente conversou com Milton, vocalista do Bayside, sobre essa nova fase, e o papo completo, você pode ler a seguir.
Entrevista – Milton Aguiar, Bayside Kings
Depois de mais de 10 anos, vocês decidiram cantar em português, e disseram que isso aconteceu porque queriam passar a mensagem para mais pessoas, especialmente depois do último contexto político do país… mas como foi isso na prática? Teve alguma resistência da banda? Quais as maiores dificuldades que vocês têm encontrado agora compondo em português?
Na verdade, a gente sempre foi confrontado sobre porque a gente não cantava em português, e eu sempre falava que pro som que o Bayside Kings faz, eu não tinha referências em português. Todas as minhas influências cantavam em inglês e eram bandas americanas ou europeias, mas vários fatores me levaram a mudar de ideia. Primeiro, que a gente vive em um país continental, então viajando pelo Brasil, a gente percebeu que quase ninguém fala inglês, e se eu encaro o hardcore como uma forma de derrubar muros e a gente poder conversar mais, a mensagem é tão importante quanto o som, então, eu queria deixar a parada mais linear possível pra dialogar com todo mundo.
Além disso, teve nosso cenário sociopolítico pelo qual a gente vinha passando nos últimos dez anos… eu acho que era muito importante resgatar o diálogo, e conversar sobre o que fazer, porque, pra mim, música é conexão, hardcore e punk é questionamento interno e externo. Então, a nossa missão era alinhar essas paradas todas pra chegar nesse som que é a cara da banda e fechou de uma forma linda. E, agora, eu não me vejo mais fazendo som em inglês.
Aí eu tive que mergulhar em outras referências que eu não tinha. Eu escuto muito rap e passei a ouvir mais ainda pra entender como usar o português em música e aprender novas palavras, novas formas de rima e tudo mais. Tive que ouvir um pouco de MPB também, como Belchior, Cazuza, Paralamas do Sucesso… Ainda está sendo um processo, mas eu acho que hoje é muito menos doloroso do que foi no começo, porque tudo que a gente faz com repetição, a gente vai aperfeiçoando, mas eu só demorei uns 10 anos pra entender que era assim, rs.
Você falou de rap e MPB, que já são estilos bem diferentes do Bayside Kings, mas tem algum outro estilo ou até mesmo artistas que ninguém imagina que você poderia ouvir, mas você ouve e te inspira de alguma forma?
Eu não acho que seja tão diferente do Bayside Kings, mas Charlie Brown Jr. faz parte do meu DNA. É impossível ser de Santos e não se gostar de Charlie Brown Jr., então trazemos a influência deles pro nosso som de algum jeito.
Outra banda, é o CPM 22, que eu ouço desde moleque e que, lá atrás, pegaram o punk rock, o estilo do Face to Face, e conseguiram abrasileirar essa parada. Então, é uma outra referência que eu tenho, até porque um dos maiores medos que eu tive quando comecei a compor em português era que soasse inocente, bobo, ou totalmente repetitivo de tudo que eu já ouvi, ou que não soasse Bayside Kings. Por exemplo, as minhas influências máximas de hardcore no Brasil são Dead Fish e CPM 22 e, por mais que eu goste e respeite, não queria emular essas bandas, então eu tive que aprender com elas a abrasileirar o som que eu fazia e adaptar para o português.
Já que você falou de CPM 22, vamos falar da Repetente, afinal vocês são a mais nova banda do selo. Como começou essa parceria e o que vocês esperam pro futuro da banda agora que os lançamentos serão pela Repetente?
A gente está bem feliz porque é uma novidade para os dois lados. Acho que é uma novidade pra eles, atuantes como selo, e pra gente é estar com novos parceiros, porque a gente tinha um outro parceiro de distribuição, mas ele encerrou as atividades, então tudo casou perfeitamente.
Eu e o Badauí já conversamos outras vezes, mas quando nosso distribuidor encerrou as atividades, tomamos a decisão de falar com ele novamente. E antes disso, eu comecei a trabalhar com eles na questão de marketing digital voltado pra bandas, que é uma algo que eu faço além do Bayside.
E é muito bom estar perto de pessoas que conseguiram validar o punk e o hardcore no Brasil, porque na história do CPM 22, o que me encanta é como eles, assim como Dead Fish e Ratos de Porão, estão em atividade há tantos anos e continuam produzindo. É um grande aprendizado, especialmente pro Bayside Kings saber como alcançar lugares que o hardcore não alcança naturalmente.
É tentar responder a pergunta de “como fazer o Bayside Kings chegar em todo mundo sem perder o DNA de ser uma banda totalmente selvagem?” A gente quer tocar em grandes festivais, ocupar novos lugares que, na cena punk, parece impossível sem entrar no estigma de “tem que se vender”.
E a gente tá vendo o cenário musical mudando, porque algumas coisas que não eram aceitas antes, hoje estão tocando na rádio, como o Bring Me The Horizon, que faz um som totalmente gritado, mas acrescentou elementos mais pop… e o próprio Turnstille, que tocou no Lollapalooza, e que acrescentou elementos indie, mas se você tirar esses elementos, continua sendo uma banda selvagem. Então é possível fazer.
Vocês são muito ativos nas redes sociais, inclusive, se diferenciando de outras bandas, como no caso do Blink no Lollapalooza, em que vocês colocaram o vídeo do Tom Delonge falando sobre o Bayside… Então você tem estudado formas de levar a banda pra mais pessoas apesar das dificuldades do cenário, né?
Eu estudei tanto que virou até uma carreira nova pra mim. Eu vinha estudando por conta da banda, já que não tinhamos como pagar pra alguém cuidar de redes sociais, merch, agendamento de shows…então ficou o famoso “faça você mesmo”, e com o tempo fui aprendendo várias coisas, mas eu sou apaixonado por marketing digital, uma das faculdades que eu nunca terminei era Publicidade e Propaganda, porque eu gosto de comunicação.
Então, graças ao Bayside Kings e ao hardcore, eu me capacitei aprendendo “na marra” e hoje eu consigo ajudar outras pessoas. E, nos últimos anos, tem sido transformador ver a banda se profissionalizando e hoje a banda ser uma das nossas fontes de renda, por isso que a gente quer ocupar novos lugares. E, por mais que pareça utopia, e tem muita gente que me chama de doido, rs., mas se eu pegar o impossível e quebrar em pedaços, dá pra ir tornando possível. Parecia impossível sair de Santos, depois sair do estado e depois sair do Brasil, mas tudo isso tem acontecido, com muito suor e dedicação, abrindo mão de várias coisas, mas eu não me arrependo de nada que eu fiz pra chegar até aqui.
Mas eu ganhei na mega-sena porque eu toco com as melhores pessoas da minha geração de Santos, todas as pessoas até ex-integrantes. Eu só tenho a agradecer, e como a gente tá muito alinhado no que a gente quer, essas coisas vão acontecer. Cedo ou tarde a gente vai quebrar padrões, porque a gente quer que a banda dure mais que a nossa existência.
Agora, sobre o (DES)OBEDECER, que é o começo da 3ª parte do #LivreParaTodos, um álbum dividido em 4 partes. Explica pra gente o conceito do álbum, como que essa ideia se desenvolveu? E quais são os próximos passos?
O #LivreParaTodos tem um conceito artístico e um conceito racional. O conceito racional é mais fácil, é o primeiro álbum em português, então se a gente lançasse tudo de uma vez, seria preciso já estar trabalhando em mais uns 3 álbuns, no mínimo, então teria que ser algo com mais velocidade. Por isso, a gente pensou em se empenhar em um álbum, mas a gente separa esse disco em singles, que é uma das formas que as pessoas mais consomem música hoje em dia, e vamos contar uma história, e aí entra o conceito artístico, de criar um personagem, dentro de um universo baseado em obras como Watchmen, V de Vingança e Pulp Fiction e que passe uma mensagem de autorrevolução, de começar a mudar o ambiente ao seu redor a partir de você mesmo. E o personagem, ninguém sabe se é homem ou mulher, mas é representado por uma caveira, que em várias culturas é colocada como unidade de igualdade.
E outra coisa que queríamos era tornar o disco uma forma de entretenimento, porque eu acho que hardcore é mensagem e política, mas é preciso nivelar, tem que ser divertido, ás vezes, as pessoas só querem ir pra um lugar e se divertir, não ficar discutindo o tempo todo. Por isso juntamos essa parada da mensagem política do hardcore, mas com essa história por trás, contada devagar, porque ajuda na nossa estratégia a longo prazo e pra saber se o público está gostando ou não das músicas em português, e ainda bem que estão.
E o álbum completo sai esse ano?
Não, a primeira parte (Existência) saiu em 2021, a segunda (Tempo) em 2022, agora a terceira parte começou com (Des)Obedecer, e tem um próximo single pra sair em setembro. O EP completo sai dia 10 de novembro.
No ano que vem lançamos a 4ª parte, e sairá uma edição deluxe, com mais músicas inéditas. E aí a gente pretende lançar o #LivreParaTodos em formato físico, em um material legal, incluindo a comemoração de 10 anos da banda que ficou de lado por conta da pandemia. E a ordem das músicas no álbum vai mudar, então será outra experiência, diferente das músicas escutadas em partes até aqui.
E sábado agora vocês tocam no Smashpit Fëst, na primeira edição do festival, então conta pra gente o que o público pode esperar desse show?
Se você viu essa entrevista até aqui, obrigado pelo suporte! E sábado, dia 12, tocamos no Smashpit Fëst, um evento de crossover e hardcore, organizado pelas minas da Eskröta e pela Estelita, no Hangar 110. E a gente tá com a ideia de tocar um cover que a gente não toca há muito tempo, do Suicidal Tendencies e que combina super com o evento. Então nos vemos no Hangar 110, Bayside Kings às 19h no palco!
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