Fazendo sua estreia no Brasil, o Primavera Sound, festival que acontece desde 2001 em Barcelona, já deixou saudade logo depois da primeira edição.
Apesar de alguns erros na organização, o festival contou com line up diverso, espaços amplos, poucas filas e palcos inovadores.
O line up queridinho dos indies
Com a notícia, no início do ano, de que o Arctic Monkeys seria um dos headliners do festival, as expectativas para o Primavera só cresceram, e com o line up confirmado, que incluía não só os britânicos, mas também outros nomes queridinhos dos indies de todas as idades, de Björk a Lorde, muita gente elogiou a seleção de artistas, destacando a diversidade de sons em um único fim de semana.
Além do festival em si, que aconteceu 5 e 6 de novembro, o Primavera tem um pré-fest, o Primavera na Cidade, que também contou com um line diversificado e muito elogiado, e é sem dúvida um destaque positivo, já que assim é possível incluir mais artistas no festival como um todo, além de espalhar o nome do festival e bons shows pela capital paulista.
Horários nada favoráveis prejudicaram público e artistas
Porém, tanto o festival quanto o Primavera na Cidade pecaram nos horários deixados para algumas apresentações.
Conforme destacamos na nossa resenha do Primavera na Cidade, shows que aconteceram após a 00h tiveram público bem reduzido, o que gerou boatos nas redes sociais de que o pré-fest estaria “às moscas”, visto que muita gente reclamou da dificuldade em resgatar os ingressos para o Primavera na Cidade. Às moscas não estava, mas esvaziando ao longo da noite, sim.
O mesmo problema de horário aconteceu no fim de semana do festival. O Distrito Anhembi já não tem estações por perto, e na cidade de São Paulo, as linhas de trem e metrô não funcionam 24h. O ideal seria shows que terminassem até 23h, mas a organização manteve a ideia de encerrar às 2h da manhã, incluindo o show da Charli XCX, nome super esperado da edição.
Mesmo com duas saídas destinadas apenas para Uber, o público encontrou muita dificuldade para sair do festival, devido à alta demanda e o trânsito que se formou na região.
Mas não foi só o público que se prejudicou. A funkeira MC Dricka postou no twitter que esperava ter fãs em seu show, que aconteceu no mesmo horário da Charli. E o rapper L7nnon se apresentou de madrugada após o show do Arctic Monkeys para um Primavera Sound já não mais tão cheio.
Palco principal entre árvores desagradou, mas foi o único erro na estrutura
Um dos palcos principais do festival, o Beck’s, foi montado no estacionamento do Anhembi, que é cercado por árvores. Em shows menores, a vibe criada pela natureza ao redor era reconfortante, mas em shows maiores era praticamente impossível ver o palco.
Até o show da Japanese Breakfast, que foi no meio da tarde, distante dos horários dos headliners, esbarrou na falta de visualização por quem estava mais pra trás.
Além disso, o palco Beck’s era mais baixo e a quantidade de telões não melhorou muito a experiência, já que em alguns pontos só se viam troncos, galhos, ferros, caixas de som… qualquer coisa, menos o palco.
Em compensação, o palco Primavera tinha vista perfeita, espaço amplo e até gramado artificial para descanso.
O Palco Bits foi muito bem colocado dentro de um galpão, com bar e banheiro exclusivos, e uma atmosfera de balada, já que o espaço era escuro até durante o dia e o som ficava ainda mais alto lá dentro.
Assim como o Bits, que parecia um mundo à parte do festival, os shows do Auditório Barcelona foram mais um acerto da organização, um ponto de calmaria em meio à agitação, com apresentações de artistas como Hermeto Pascoal e Tim Bernardes, em um clima intimista e relaxante. Nunca imaginei ver algo assim em um festival.
Mas o Palco Elo ganhou o público. Montado na avenida onde as escolas de samba desfilam, era possível assistir aos shows do chão ou sentado na arquibancada. Por lá passaram Santiago Motorizado, Bad Gyal, Maglore, entre outros.
Os shows mais memoráveis da primeira edição do Primavera Sound no Brasil
Distribuídos em 5 palcos, o que não faltou foi show memorável, mas claro que alguns se destacaram.
Apesar dos grandes headliners serem homens (Arctic Monkeys e Travis Scott), o festival foi uma sequência de destaques femininos.
Dia 1: indies felizes e mulheres tomando conta de todos os palcos
No primeiro dia, Tasha & Tracie justificaram o hype que ganharam nos últimos meses com um show simples, mas poderoso que inaugurou o palco Beck’s.
Já no palco Primavera, Liniker fez um show histórico e dançante, viu que muita gente conhece suas músicas do início ao fim e se despediu para que Björk e Mitski fizessem história no festival também.
Björk já começou “causando” ao exibir um anúncio pedindo que não filmassem ou fotografassem sua apresentação. A cantora é desde sempre uma artista estilo “ame ou odeie” e mesmo lotando o palco Primavera, foi possível ver algumas pessoas mais jovens torcendo o nariz para a cantora, que se apresentou vestida de inseto e que tem um som muito diferente.
Os shows do Palco Primavera eram transmitidos no telão do palco Becks e enquanto os fãs de Interpol e Arctic Monkeys reclamavam do som da Mitski, ela emocionava o público que foi vê-la de perto.
E falando nas duas bandas mais aguardadas do primeiro dia, os shows não apresentaram nada de inovador além das músicas mais recentes, já que tanto Interpol quanto o Arctic Monkeys lançaram álbuns novos este ano, mas não sei se o público esperava mais do que entregaram. E isso não é uma crítica, afinal a pessoa que escreve esse artigo é uma fã de Interpol que viu ali exatamente o que queria, um show e tanto, sem “firulas”.
Dia 2: rock nacional, trap com mega produção e cantoras pop
No segundo dia, Maglore e Terno Rei provaram que o rock nacional tem sim muito público e segue muito vivo.
Maglore, no palco Elo, fez um show com ar de bloco de carnaval, e esquentou até quem quis ver o show da arquibancada. O vocalista intercalou discursos políticos, ressaltando a importância de Lula para o nordeste (a banda é de Salvador), com momentos emocionados, afinal era um festival e muita gente chegou cedo pra ver a banda e cantar junto.
Mas, de novo, a noite foi das mulheres e os destaques ficaram por conta de Phoebe Bridgers, que levou muita gente às lágrimas com suas músicas melancólicas e um telão cheio de estrelas; e, claro, Lorde, a estrela da noite.
Com um relógio solar no meio do palco, Lorde fez questão de mostrar que não só ama o verão, como ama o Brasil, fazendo vários discursos emocionados sobre o carinho dos fãs brasileiros e sobre como a vida dela mudou desde sua primeira passagem pelo país.
Até quem não conhecia muito a fundo o trabalho de Lorde se apaixonou depois desse show, que teve passinhos de dança, participação de Phoebe Bridgers, e até a surpresa de “Royals”, maior hit da carreira de Lorde e que normalmente é deixado de lado.
Outro ponto alto do show foi “Bravado”, música que também nunca entra no repertório, mas foi especial no Brasil depois que os fãs daqui colocaram a música em primeiro lugar no Itunes.
No palco Beck’s, um show de luzes, pirotecnia e produção foi visto no show de Travis Scott, um fato bem inovador em shows de rap. E Travis, apesar de não gostar de câmeras e filmagens, inclusive interrompendo uma música pra reclamar disso, é carismático e levou até um fã pro palco em “Goosebumps”.
O mesmo palco Beck’s recebeu Charli XCX, que se apresentou para uma legião de fãs tão apaixonados que ficaram até 2h da manhã pra ver a cantora.
O choque cultural entre Millenials e Gen Z visto ao vivo
O interessante foi notar o choque de gerações e estilos entre um dia e outro de Primavera Sound.
No sábado, o que mais se via eram camisetas estampadas com o nome do Arctic Monkeys, do Interpol ou com o rosto da Björk, todas vestidas por pessoas entre 25 e 35 anos.
Já o domingo foi o dia dos fãs de Lorde e Charli XCX mostrarem os famosos looks de festival, que nem sempre são confortáveis, mas são impecáveis, e esbarrarem nas camisas largas com o rosto de Travis Scott.
Acertando mais do que errando, Primavera Sound já deixou saudade
Apesar das árvores em frente ao palco Beck’s, algumas filas na hora de entrar e os horários absurdos dos últimos shows, o Primavera Sound fez uma belíssima estreia no Brasil.
Como contraponto aos erros, além de acertar no line up, o festival forneceu copos reutilizáveis, água gratuita, muitos espaços de descanso, muitas opções de alimentação, com bares espalhados por todo o evento além de uma praça de alimentação e, o melhor, zero filas em caixas, lojas, bares e banheiros.
O festival também prezou pela acessibilidade e pelo respeito às diferenças, com banheiros para PCDs, já próprios do Anhembi, banheiros unissex e intérpretes de Libras em todos os shows do palco Beck’s.
A distância entre os palcos principais era grande, mas nada absurdo pra quem costuma frequentar festivais. E mesmo sem estações por perto, o Anhembi foi uma excelente escolha para abrigar o evento, que utilizou todos os espaços possíveis do sambódromo e deixou todo mundo confortável.
Se esses pequenos erros forem corrigidoss nas próximas edições, o Primavera Sound tem tudo para se tornar um dos melhores festivais do Brasil nos próximos anos.
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