Resenha por Lucas Barbosa
Fotos por Pê Oliveira
Se há uma coisa que fez falta durante os dois anos mais críticos da pandemia, definitivamente eram os shows underground. E no último sábado (8), o público paulistano foi presenteado com uma verdadeira aula em um show da tour de despedida dos costa-riquenhos do Billy The Kid, já velhos conhecidos do público brasileiro.
Completando a festa, que aconteceu na Jai Club, Never Look Back, de Brasília, e os paulistanos do Escombro, Good Intentions e Paura fecharam o lineup do rolê assinado pela Xaninho Discos e Agência Sob Controle.
Pouco depois das 18h, o Never Look Back deu início aos trabalhos. A banda, formada por membros do conhecido Lost In Hate, aposta na fórmula clássica do Metalcore, unindo peso e melodia.
Diferente de eventos onde o público só lota a casa para ver o headliner, a Jai Club já estava cheia na primeira banda, e assim permaneceu por toda a festa. “É muito bom estar de volta após esses dois anos sombrios”, pontuou o vocalista Kenji, fazendo clara referência à pandemia, que impossibilitou a realização de shows por um bom tempo.
Após essa fala, a música “Meu Caminho” reforçou a ideia, exaltando a importância de se manter de pé em tempos adversos. “Única Saída” foi outro ponto alto do show que, vale ressaltar, manteve sua energia, não perdeu dinâmica um só segundo e foi responsável pelos primeiros dos muitos two steps da noite.
“One Day At a Time”, música que ganhou clipe recentemente, também fez parte do setlist dos brasilienses e é talvez um dos sons com mais elementos melódicos da banda. “Um só coração” fechou a apresentação, que durou cerca de meia hora.
Logo em seguida, foi a vez da Escombro subir ao palco. Com o público já incendiado pela apresentação anterior, não surpreendentemente o show já começou a mil. Tanto que, na segunda música, ânimos exaltados geraram um pequeno tumulto. “Se quer brigar, a gente cata nossas coisas e sai fora”, disse o vocal Jota enquanto a banda recomeçava “No Veneno”.
Com tudo mais calmo, “Sobrevivendo no Inferno” deu prosseguimento ao show do Escombro, mantendo sempre o tom político antifascista em sua mensagem. “Descaso”, um dos clássicos da banda paulistana, obviamente não ficou de fora do setlist. “Libertar” deu sequência aos clássicos e colocou o público para cantar junto.
“O Peso de Sobreviver” fez parte do último bloco da banda e fez justiça ao título da música: muito peso. “Acreditar” fechou o setlist do Escombro, com o pedido do vocalista por “mais calor humano” sendo prontamente atendido pelo público naquela noite quente de sábado, que ficaria ainda mais quente.
Dando sequência à programação, Good Intentions, veteranos da cena straight edge de São Paulo, subiram ao palco. Antes mesmo da banda iniciar sua apresentação, o vocalista André Vieland falou sobre a felicidade de poder voltar a um show e enfrentar o problema de depressão. “É legal estar aqui com pessoas que acreditam no mesmo que nós, que têm o mesmo ideal”, disse.
Após isso, “Convicto” abriu o show da banda e, claro, o sing along rolou solto, com o público dividindo o microfone com o vocalista. “Fase que não passa” deu sequência ao show e emocionou quem até hoje faz o X na mão.
E como um bom show de hardcore pede, não faltaram stage dives. “Nada para esconder” fechou o primeiro bloco de um show cheio de muita energia. Nas pausas, Vieland falava sobre a importância da atuação política do hardcore e sobre o veganismo como instrumento de transformação social. “Vida Simples” veio em seguida e, como sempre, a energia do guitarrista Fausto Oi – o homem das mil bandas -, figura conhecidíssima do underground nacional, era impressionante.
Na apresentação, Mateus Santos, do Time and Distance, substituía Leonardo Cantinfras, que saiu recentemente da banda. Na bateria, Bruno Monteiro, também do Time and Distance, substituiu o baterista original, que se recuperava de uma cirurgia. E foi justamente do Time and Distance a música que veio a seguir: “Hand of Power”.
Fechando o set, o clássico “Marque essas Palavras” encerrou a apresentação do Good Intentions, com o público agitando ao máximo, afinal, a música é um verdadeiro hino do straight edge brasileiro.
Penúltima banda da noite, o Paura subiu ao palco em seguida. A banda liderada por Fábio Prandini iniciou o setlist já mostrando a que veio, com “Truth Hits Hard”, do disco Tameless, de 2014. Com quase 30 anos de estrada, os veteranos chamaram o público para perto e deram continuidade à energia da noite. O set do Paura passou por diversas fases, presenteando o público com clássicos como “No Hard Feelings? Fuck You!” e “Reverse The Flow”.
Também do Tameless, “NWA (Never Walk Alone)” fez parte do setlist e foi responsável por um dos moshpits mais brutais da noite, que ganharia uma bela surpresa logo em seguida: um belíssimo cover de “Sailin’ On”, do Bad Brains – uma das bandas preferidas de Prandini –, que fez todo o público cantar junto, afinal, clássico é clássico.
Nas pausas do show, falas importantes do frontman do Paura sobre o atual momento político vivido pelo Brasil: “Se você é preto, você é bem-vindo. Se você é preta, você é bem-vinda. Se você é LGBTQIA+, você é bem-vinde. Se você é nordestino, você é bem-vindo. Estamos vivendo um regime fascista e temos uma dívida enorme com vocês. Mas tá chegando o dia que o fascista vai cair”, disse.
“History Bleeds”, faixa título de um dos discos mais emblemáticos do Paura, fechou o setlist, com o público “a milhão”. Definitivamente, a banda não perde a mão, só melhora.
Por fim, os headliners do Billy The Kid subiram ao palco da Jai Club para sua última apresentação em São Paulo, com o vocalista Eddy arranhando um portunhol para falar sobre como estava feliz em poder voltar ao Brasil.
Com muito carisma, ele levou o público para a beira do palco e a festa começou com a versão dub de “Rockefeller”. Durante a apresentação, o público era contagiado pela energia da banda, dando stage dives e fazendo moshpits insanos.
Definitivamente, o hardcore sul-americano tem um “calor a mais”. “É um sonho poder voltar aqui depois de tantos anos. Fazer essa turnê de despedida aqui é muito importante para nós. São Paulo é sempre muito calorosa, e eu só queria dizer ‘muito obrigado’ a todos vocês”, disse Eddy em uma das pausas do show.
Em seguida, a banda tocou “xTrezxEquizx”, clara alusão ao straight edge que, assim como o Good Intentions, é uma das bandeiras do Billy The Kid. Com moshs que se estendiam até o fim da pista da Jai Club, os costa-riquenhos fizeram uma apresentação com muito calor humano e energia. “Todos pulando, everybody pulando”, bradava Eddy durante as músicas.
“Gorilla” foi um dos pontos altos do show, gerando uma quantidade absurda de stage dives e sing alongs. Mas o ápice, definitivamente, estava guardado para o final.
Com a clássica “Jonestown”, a banda fechou sua apresentação na Jai Club, incendiando desde fãs mais antigos a adeptos mais recentes. Sem dúvidas, foi um dos shows mais enérgicos que já vi na vida.
Visivelmente emocionado, Eddy desceu do palco após a apresentação e abraçou, um por um, todos que estavam na pista durante o show, fechando uma noite que com certeza ficou marcada no coração de muita gente.